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2012 | Texto de Bernardo Mosqueira para a exposição "E os amigos sinceros também."

Ao meu amor;
Ao meu amor.


Ele completava 75 anos. Na ocasião desta comemoração, seu mais antigo e velho conhecido se levantou a discursar para os convidados. Fez questão de lembrar os grandes feitos do aniversariante: onde ele esteve, quando ele fez, como ele conseguiu: suas vitórias, seus acertos, sua importância histórica, sua coerência, seu posicionamento bem definido, sua reta trajetória, sua certeza. O público convidado (em sua maior parte, já seduzido por perfis de revistas de celebridades e resumos mal feitos por livros de História) se emocionava ouvindo as belas palavras e assistindo à apresentação de slides com curiosas fotos de arquivo pessoal.

Se, naquele momento, estivesse morto ou morrendo, quase ninguém teria percebido. Encantados pelo espetáculo de narrativa do falante, foi necessário algum tempo para que se percebesse a ausência daquele que deveria ser protagonista (e não tema) da festa. Pois, então, voltando os olhares ao fundo do salão, a multidão presente se surpreende: a vida estava abrindo as pernas e, de seu meio, seu anfitrião saía - nu. Nascendo. Renascendo.

O falatório cessou, e a verdade sobre o aniversariante estava ali: diante dos olhos de todos, o renascer diário do sempre jovem idoso. O ritual do parto (que, em sua prática, não podia ser natural nem cesariano) era sempre estimulado ou acompanhado por um alternante grupo voluntário que dava seu suor, seu sangue, seu sorrir e seu sopro em nome da vida e do passageiro e proveitoso convívio com este que, então, mais uma vez, aniversariava e renascia.

O Ibeu completa, neste janeiro de 2012, 75 anos. Sendo o integrante mais recente na Comissão Cultural desta instituição, fui convidado a elaborar uma exposição devidamente comemorativa. Mesmo com todo o interesse no passado desta galeria (que, como o de qualquer um que chega a esta idade, não é formado apenas por glória, vitória, acerto, retidão e certeza), cuidei para que meu papel, neste momento, não fosse o de construir e reverberar qualquer memória. Compete a mim e me importa, com clareza, usar o passado como instrumento (e não como matéria) para que, assim, possa apontar para a possibilidade das próximas primaveras estivais.

Com ajuda fundamental da equipe do Centro Cultural do Ibeu, foram listados os mais de 1500 artistas que estiveram presentes nesta história em exposições coletivas ou individuais. Buscando, sempre, uma maneira de fazer da exposição um evento fértil para todas as partes, convidei 24 daqueles artistas a retornarem à galeria com trabalhos “bastardos”, geradores, inéditos ou pouco vistos. Este recorte intenciona antecipar retornos aos artistas participantes em relação aos trabalhos expostos e, com isso, incitar reações, nos artistas, de transformação, construção ou tomadas de consciência sobre o trabalho exposto e suas implicações.

A principal ação proposta por essa mostra é a de atualizar as passagens destes artistas por este espaço, convidando-os a voltarem, simultaneamente (2, 3, 15, 30 anos após), à galeria pela qual passaram um dia. Evidenciamos, assim, a relevância e a atividade de cada um deles – agora.

Sendo uma mostra que celebra um aniversário, mas que expõe aqueles que construíram, deram corpo ou acompanharam o passar desses anos que celebramos, a exposição tem seu título retirado de uma canção comemorativa que deseja que o aniversariante chegue ao centenário – e os amigos sinceros também.


Bernardo Mosqueira
Janeiro 2012