1. A atmosfera da arte contemporânea é composta também pelo que se fala dela. A escrita contemporânea, nesse sentido, possui uma curiosa responsabilidade. Ela se distingue das asserções comuns irrefletidas sobre o que deveria ser uma obra de arte, esculturas bonitas e naturezas mortas, e apresenta o relato vivo de quem esteve disposto a ter a experiência que o artista montou. A escrita contemporânea sofre na linguagem o efeito da arte contemporânea e o manifesta. A mesma liberdade de meios é, ou poderia ser, explorada por quem se expressa sobre; a escrita se oferece para ser utilizada expandida. O texto pode ter elementos imagéticos preponderantes, veiculado a diversos suportes, é possível que retorne à fala como performance ou, convencionalmente, à parede branca.
2. À escrita contemporânea sobre arte contemporânea é passível conter pedaços informativos sobre o trabalho e o artista com os quais se mistura. Eles, apesar de importantes para dar localidade sobre trajetória, matéria e proposta, não podem ser preponderantes. O tipo de expressão que realiza é precedida pelo inicial estado de passividade, quase ao lado, como Aquiles e a Tartaruga. É derramada a primeira gota, como a Tartaruga, o artista sai primeiro. A quem escreve não cabe cobrir o sangue ou apostar corrida e sim correr depois / e nunca alcançar. Se há uma regra é a imobilidade, antes que a arte comece e se possa fazer uma arte depois. A escrita é desencadeada pelo esforço do outro. Daí é que nele se afunda, como quem é tragado para dentro da areia da ampulheta. Não se sabe bem para o que olha a Tartaruga, Aquiles dela não tira os olhos.
3. Assim, falar sobre e como são espécies do gênero falar a partir. A partir descreve aquilo que experimenta, menos para que se possa dar a encontrar um referente e mais para descobrir as palavras adequadas para aquilo que se sentiu. A partir interpreta o sentido do que assiste e oferece esse esforço como um facilitador para quem se coloca em posição parecida, ainda que não com tanta disposição, aprofundamento e ardil. A partir insere a situação, ou pelo menos o seu aroma, em uma nova narrativa que alegoriza os pontos densos da experiência. A partir ainda permite que a escrita seja móbil para inventar um conceito, cujas partes sejam tomadas da iniciativa atentada. Se, por um lado, as obrigações da escrita contemporânea sobre arte acabam por torná-la pouco atraente ao jornalismo, elas oferecem ao leitor a possibilidade, por vezes arriscada, de ser colocado no centro de um furacão, ao qual só teria acesso depois de muito esforço de gosto e ambientação com diferentes ideias ou de simplesmente ter uma prova da criatividade operando em cumplicidade.
4. A escrita da qual falamos encontra seus principais recursos no ensaio; que por definição é crítico, não no sentido da simples posição do polegar, porém como rastro do gosto aprofundado. O ensaio é a escrita dos céticos, porque nele importa que a subjetividade de quem escreve se misture com o motivo que a desencadeia a dizer. Impropriamente se diz do ensaio um gênero literário ou uma forma. A parte mais importante dele é que se trata de resultado, gênero ou forma, antecedido pela vontade expressiva. Nessa direção é que ele é bastante mais plástico do que outras práticas enunciativas. A poesia, a prosa poética, o aforismo, a narrativa etc. surgem do interesse pelo que não é de quem escreve, por isso se tornam ensaios. Apenas a disposição ao dois, ao três, que é conquistada internamente, por assim dizer, ao movimento causado pelo que é estranho, exterior, outro etc.
5. À escrita contemporânea é vedada a especialidade, nisso é ainda mais virtuosa do que vivendo a partir. Se ela encontra uma maneira de se compor com algo e começa a repetir a identidade, ora, está extinto o risco, e se inicia o virtuosismo. A literatura que se faz desde o contemporâneo não permite, salvo por impostura, ser o dono de um tipo de forma de vida. É-se dela, promiscuamente. A autoridade sobre o corpo, a violência, a terra etc. nada mais é do que esterilidade. Porque se o contemporâneo é apresentado como propriedade, ele cede ao compro ou não compro, quero ou não quero etc. A escrita, no contemporâneo, precisa sacrificar a autoridade. Ela é uma forma de testemunho.
2. À escrita contemporânea sobre arte contemporânea é passível conter pedaços informativos sobre o trabalho e o artista com os quais se mistura. Eles, apesar de importantes para dar localidade sobre trajetória, matéria e proposta, não podem ser preponderantes. O tipo de expressão que realiza é precedida pelo inicial estado de passividade, quase ao lado, como Aquiles e a Tartaruga. É derramada a primeira gota, como a Tartaruga, o artista sai primeiro. A quem escreve não cabe cobrir o sangue ou apostar corrida e sim correr depois / e nunca alcançar. Se há uma regra é a imobilidade, antes que a arte comece e se possa fazer uma arte depois. A escrita é desencadeada pelo esforço do outro. Daí é que nele se afunda, como quem é tragado para dentro da areia da ampulheta. Não se sabe bem para o que olha a Tartaruga, Aquiles dela não tira os olhos.
3. Assim, falar sobre e como são espécies do gênero falar a partir. A partir descreve aquilo que experimenta, menos para que se possa dar a encontrar um referente e mais para descobrir as palavras adequadas para aquilo que se sentiu. A partir interpreta o sentido do que assiste e oferece esse esforço como um facilitador para quem se coloca em posição parecida, ainda que não com tanta disposição, aprofundamento e ardil. A partir insere a situação, ou pelo menos o seu aroma, em uma nova narrativa que alegoriza os pontos densos da experiência. A partir ainda permite que a escrita seja móbil para inventar um conceito, cujas partes sejam tomadas da iniciativa atentada. Se, por um lado, as obrigações da escrita contemporânea sobre arte acabam por torná-la pouco atraente ao jornalismo, elas oferecem ao leitor a possibilidade, por vezes arriscada, de ser colocado no centro de um furacão, ao qual só teria acesso depois de muito esforço de gosto e ambientação com diferentes ideias ou de simplesmente ter uma prova da criatividade operando em cumplicidade.
4. A escrita da qual falamos encontra seus principais recursos no ensaio; que por definição é crítico, não no sentido da simples posição do polegar, porém como rastro do gosto aprofundado. O ensaio é a escrita dos céticos, porque nele importa que a subjetividade de quem escreve se misture com o motivo que a desencadeia a dizer. Impropriamente se diz do ensaio um gênero literário ou uma forma. A parte mais importante dele é que se trata de resultado, gênero ou forma, antecedido pela vontade expressiva. Nessa direção é que ele é bastante mais plástico do que outras práticas enunciativas. A poesia, a prosa poética, o aforismo, a narrativa etc. surgem do interesse pelo que não é de quem escreve, por isso se tornam ensaios. Apenas a disposição ao dois, ao três, que é conquistada internamente, por assim dizer, ao movimento causado pelo que é estranho, exterior, outro etc.
5. À escrita contemporânea é vedada a especialidade, nisso é ainda mais virtuosa do que vivendo a partir. Se ela encontra uma maneira de se compor com algo e começa a repetir a identidade, ora, está extinto o risco, e se inicia o virtuosismo. A literatura que se faz desde o contemporâneo não permite, salvo por impostura, ser o dono de um tipo de forma de vida. É-se dela, promiscuamente. A autoridade sobre o corpo, a violência, a terra etc. nada mais é do que esterilidade. Porque se o contemporâneo é apresentado como propriedade, ele cede ao compro ou não compro, quero ou não quero etc. A escrita, no contemporâneo, precisa sacrificar a autoridade. Ela é uma forma de testemunho.